terça-feira, 12 de outubro de 2010

Um Cortejo de Oferendas

O artigo da Prof.ª Zulmira Linhares sobre o P.e Leopoldino Mateus dá conta duma campanha em que o P.e Leopoldino se empenhou. O hospital poveiro atravessava uma séria crise financeira e era necessário mobilizar as pessoas para o ajudarem. O pároco de Balasar escreve três breves artigos para o Idea Nova e propõe num deles a realização dum cortejo de oferendas. O cortejo realizou-se e foi um sucesso.
A freguesia teve uma participação generosa: uma camioneta com lenha, batata e colmo, 60 cestos cheios de géneros, um casal de perus e a oferta de 2.300$00.

Nossa Senhora das Dores

A Prof.ª Zulmira Linhares facultou-nos cópia de dois artigos do P.e Leopoldino sobre Nossa Senhora da Dores saídos no Ala Arriba dos anos de 1957 e 1958. Vamos transcrever o primeiro deles. O autor já voltara para a Póvoa e naturalmente foi requisitado para escrever sobre o tema pelo seu amigo P.e José Cascão.
Num primeiro momento, o articulista analisa a situação existencial do homem, sujeito ao sofrimento, à luz da revelação bíblica, depois evoca a Mãe das Dores, cujo sofrimento ilumina a dor humana, e por fim refere-se à Procissão das Dores, que testemunha a fé na revelação cristã e é um exemplo concreto de esperança.

Todos A amam, todos A respeitam, todos A invocam, porque a dor acompanha a criatura desde o nascimento até à morte.
O homem nasce chorando, vive sofrendo, morre suspirando.
Ao princípio, nas delícias do Éden, reinava o amor, desempenhando o papel hoje atribuído à dor e bem mais satisfatoriamente que esta.
Se a dor nos ilumina e purifica, desprendendo-nos do que é efémero e elevando o coração dos mortais, mais rápida e nobremente exerce a mesma acção o amor.
Não houvesse fraquejado o primitivo amor no Paraíso terreal, se dele conservássemos no peito a chama viva em vez da pobre centelha que tão mal nos aquece, nunca teria existido a dor.
Precipitados no abismo da matéria, Deus, por efeito da Sua Infinita Misericórdia, concedeu-nos no próprio instante em que ia começar a queda, umas asas divinas com que nos sustentássemos e evitássemos a ruína irreparável.
O dilema está posto claramente: ou isto é a dor ou constitui uma fatalidade odiosa que inutilmente nos atormenta!
Temos de escolher entre a pesadíssima e gelada mão da fatalidade a triturar-nos, e contra a qual nada podemos, e a dextra carinhosa e paternal de Deus que, beneficente e compassiva, respeitando a nossa dignidade de seres feitos à Sua imagem e semelhança, nos toca apenas para nos melhorar e mo­dificar, a fim de que possamos alcançar uma eternidade feliz.
Entra um Deus infinitamente bom e um tirano modelíssimo (sic) não existe meio-termo.
O homem sem fé, sem temor de Deus vê no sofrimento uma penalidade que atormenta cruelmente a humanidade, mas o crente vê o justo castigo dos seus desvarios e um acto de amor divino para o chamar ao arrependimento e mudança de vida.
Temos, pois, que nos conformar com a sua sorte e com a assistência do Senhor.
Prevaricámos, devemos reparação ao Criador que nos tirou do nada, satisfação ao Redentor que nos resgatou da culpa!
Mas o homem é um ser insignificante que, olhando para a grandeza do Altíssimo a quem ofendeu, reconhece o seu nada, perdendo a esperança do perdão e da misericórdia.
Mas, de repente, uma doce visão lhe esclarece o espírito e alenta o coração, uma mulher, que é mãe, trespassado o coração com sete espadas de dor[1], lhe inspira confiança e levanta o ânimo triturado pelo sofrimento, dizendo-lhe com voz sentimental – Vê, filho, se há dor semelhante à minha dor!
Esta cena de compassividade e sentimento maternal dá-se todos os dias e milhares de vezes, por isso, não admira que Nossa Senhora das Dores, sempre terna e compassiva para os que sofrem, conte inúmeros devotos que, reconhecidos, acompanham a sua imagem tão encantadora e atraente que prende os corações que a ela recorreram nos momentos da angústia e do desamparo, formando um cortejo de gratidão e amor à Consoladora dos aflitos, à Protectora dos triturados pelo sofrimento.
No próximo domingo, ao passar a procissão em que tudo é alegria, observando as Confrarias acompa­nhando os grupos alegóricos, espera um pouco e, passado o pálio, pensa um instante nesse novo cortejo de agradecidos, revelador do panorama da dor e sofrimento a quem a Vir­gem Dolorosa protegeu e que justifica a grande devoção que os crentes lhe tributam, porque lhes valeu na desdita e no infortúnio.
Perante este quadro da dor e da gratidão, nada de desespero nem de desânimo – quando as tribulações da vida nos visitarem, levantemos os olhos, invoquemos com esperança o patrocínio de Nossa Senhora das Dores, que soube o que é sofrer e amar, e a paz, a alegria, o conforto voltarão ao nosso coração triturado pelo infortúnio.


[1] O outro artigo sobre Nossa Senhora das Dores intitula-se mesmo “As Sete Dores de Nossa Senhora”; o P.e Leopoldino enumera-as assim: 1ª – A apresentação do Menino Jesus no Templo; 2ª – Fugida da Sagrada Família para o Egipto (…); 3ª – Perda e Reencontro do Menino Jesus no Templo, entre os Doutores da Lei; 4ª – Encontro da Mãe e do Filho, condenado ao suplício da Cruz, na rua da Amargura; 5ª – Maria junto da Cruz, extática, serena, amargurada na contemplação do seu Amado Filho Agonizante; 6ª – A Senhora da Piedade, sentada aos pés do Madeiro Sagrado, com o Filho morto no regaço maternal; e 7ª – A Soledade de Maria Dolorosa.
Estas Dores estão documentadas em nichos, com várias estátuas cada um, no exterior da Capela de Nossa Senhora das Dores.

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