«Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades / muda-se o ser, muda-se a confiança», escreveu Camões. As ideias do P.e Leopoldino também se alteraram bastante. Veja-se este In Memoriam que ele fez sair em 22/10/1955, no «Ala Arriba», semana e pouco após a morte da Alexandrina, quando todos dela guardavam viva memória mas ainda não havia livros que lhe fixassem a biografia:
Ao completar-se um ano sobre a morte da Alexandrina, quando já havia sido publicada Uma Vítima da Eucaristia, do P.e Mariano Pinho, o P.e Leopoldino dedicou à Allexandrina este importante artigo:
Na freguesia de Balasar deste concelho baixou à paz do túmulo Alexandrina Maria da Costa “Vicente”, tão conhecida, pelo menos de nome, em quase todo o País.
Nasceu a 30 de Março de 1904 e faleceu a 13 de Outubro de 1955, isto é, nasceu no ano de Nossa Senhora (ano do 50.º aniversário da definição dogmática da Imaculada Conceição) e faleceu no dia da mesma Senhora, no dia último das suas aparições aos pastorinhos de Fátima.
Recebeu a primeira Comunhão na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição da Póvoa de Varzim e recebeu os ú1timos Sacramentos administrados por um sacerdote poveiro, o seu pároco.
Diz-se de Nosso Senhor no seu Evangelho que passou a vida fazendo bem; da saudosa Alexandrina também se pode garantir que passou a sua vida espalhando benefícios.
De todos os donativos que alguns visitantes lhe deixavam espontaneamente, nada queria para si, distribuía-os pelas igrejas e pelos necessitados e pelas Missões.
É conhecida a história da sua vida; era uma humilde pastorinha do campo quando, qual outra Goretti, perseguida para fins criminosos, não encontrou outro meio de escapar do crime do que lançar-se de uma janela ao quintal, o que lhe ocasionou uma doença que a prendeu ao leito da dor perto de 40 anos e sofrendo com a maior resignação.
Era uma alma de Deus toda entregue ao sacrifício pela conversão dos pecadores, salvação dos moribundos e alívio das almas do Purgatório.
O segredo da sua resignação cristã estava na Vida Eucarística, pois que recebia diariamente o Pão dos Anjos com fervor edificante e piedade singular.
A Sagrada Comunhão já há bastantes anos era a sua única comida, porque não tomava alimento algum. Nas últimas horas de sua vida, já mais do Céu que da terra, quando a sua família chorava e soluçava, assegurava-lhes: «Não chorem, que eu vou para o Céu.»
Sim, Alexandrina contava ir para o Céu, mas como os desígnios de Deus são insondáveis, é bom sufragá-la para lhe apressar o seu triunfo, se carecer de se purificar.
O seu funeral, a que assistiram cerca de 40 sacerdotes – e mais viriam se soubessem ou pudessem – foi um triunfo, uma apoteose. O seu cadáver, inumado por entre lágrimas e suspiros na terra fria, tem ainda a visita de muitos admiradores. É uma romagem constante para sua sepultura, uns a chorar outros a suplicar graças à Sacrificada que já não vêem mas que acreditam estar no Céu.
Aqui deixamos estas linhas à memória daquela que foi modelo da vida cristã.
Ao completar-se um ano sobre a morte da Alexandrina, quando já havia sido publicada Uma Vítima da Eucaristia, do P.e Mariano Pinho, o P.e Leopoldino dedicou à Allexandrina este importante artigo:
Alexandrina Maria da Costa
Passando, hoje, o primeiro aniversário do falecimento da saudosa e sempre chorada Alexandrina Maria da Costa, limito-me a repetir o que disse na despedida dos meus paroquianos de Balasar a respeito dela:
Passei convosco 23 anos e três meses e deixo-vos por motivo de doença e não por ser despedido dos superiores. Durante esse longo período de tempo baptizei a maior parte da freguesia, administrando este sacramento a 1.151 pessoas de ambos os sexos, presidi a 270 casamentos, não contando com os realizados fora, e acompanhei à sepultura 521 pessoas, crianças e adultos, destacando-se entre estes a nossa Alexandrina do Vicente. Esta rapariga do campo merece uma referência especial porque foi a minha valiosa cooperadora no múnus paroquial.
Conhecia tamanina quando recebeu a Primeira Comunhão na Igreja Matriz da Póvoa de Varzim, que lhe foi dada pelo meu saudoso condiscípulo e pároco P.e Álvaro de Campos Matos.
Quando em 8 de Julho de 1933 tomei posse da paroquialidade de Santa Eulália de Balasar, encontrei Alexandrina já presa ao leito da dor e do sofrimento, prémio da sua abnegação e sacrifício na defesa da sua pureza e integridade do seu corpo de criança de 13 para 14 anos.
Sabendo que a Santíssima Eucaristia é a vida das almas santas e puras dominadas pela doença, durante anos consecutivos ministrei-lhe a Sagrada Comunhão diariamente, sendo este, no último período da sua existência, o seu único alimento.
Um dia, sentindo que as forças me iam definhando, disse-lhe: Alexandrina, parece-me que vou deixar-vos porque me não sinto com alento para o pesado ónus desta longa freguesia.
A doente calou-se mas volvidos dias, antes de lhe dar o Pão da Vida, ao abeirar-me do seu leito, diz-me:
- Senhor Abade, não receie perder o vigor para deixar a freguesia, porque pedi a Nosso Senhor que eu morresse antes de V. Rev.cia nos deixar e Ele prometeu-me que sim e a palavra de Deus não falta.
E assim sucedeu.
Nunca recebi dela dádiva alguma para a minha pessoa, mas recebi muitas para os outros.
A meu pedido ela auxiliou eficazmente algumas missões religiosas que operaram uma grande reforma espiritual na vida dos habitantes, muitos deles um pouco esquecidos das suas obrigações de católicos.
Obtive grandes melhoramentos para a igreja paroquial em alfaias e objectos do culto, especialmente o rico e artístico cofre-sacrário, tão lindo que não será fácil encontrar igual em aldeias.
O alto-falante, adquiriu-o espontaneamente para serem ouvidas por ela e pelos que estivessem fora do recinto sagrado as homilias e leituras como exercícios de piedade, bem como os cânticos religiosos.
Tinha uma dedicação especial pelas classes pobres, valendo-lhes muitas vezes nas suas necessidades e distribuindo anualmente, dos donativos oferecidos pelos visitantes, alguns milhares de escudos em roupas pelos nus e pelos esfarrapados.
O Hospital era uma casa da sua preocupação, interessando-se ela e levando pessoas abastadas a oferecer dádivas em géneros e dinheiro à Santa Casa para que esta nunca deixasse de admitir e tratar com carinho os doentinhos de Balasar, como assim tem acontecido.
O falecido arcipreste Rev. Manuel da Costa Gomes tinha por ela grande respeito e consideração como Director das Obras do Apostolado dos Doentes e a Alexandrina, sabendo da feira das oferendas em benefício das obras da Igreja de S. José, arranjou um rico cesto e chamou bastantes conhecidas e amigas para fazerem o mesmo; por isso, Balazar marcou nessa feira.
As Missões do Ultramar foram matéria do seu zelo apostólico, fundando por intermédio dos Padres do Espírito Santo a Liam.
Presidente da Visita Domiciliária da Sagrada Família, quando sabia que em alguns lares havia desinteligências entre os casados, chamava-os para os harmonizar e juntar.
Era uma alma de Deus, cheia de zelo apostólico, trabalhando muitíssimo pela oração e pela acção na santa obra da regeneração espiritual das famílias.
Por isso, na passagem do primeiro aniversário da sua subida à Glória do Céu, como cremos, não podíamos deixar no olvido a sua memória e pedir-lhe a continuação do seu auxílio à freguesia que lhe foi berço, embora já a não pastoreemos.
L.M. Ala Arriba, 13/10/56
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